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A review by owlsreads
Quarto de Despejo by Carolina Maria de Jesus
5.0
Eu sou filha de um pai que diz que estudo não é só o que faz a inteligência. E sou neta de um vô que sempre disse que a pior coisa é não ter o que comer. Carolina Maria de Jesus mostrou exatamente isso com seu diário.
É de uma dor ler sobre a rotina dela como mulher na pobreza e miséria da favela que, apesar de ter se passado no final dos anos 50, com certeza ainda demonstra uma realidade dura vivida por muita gente hoje. A luta contra fome é, infelizmente, algo constante e presente. O ato de procurar comida no lixo, de trabalhar como catadora com a finalidade de comprar comida e nem sempre conseguir, a eterna luta atrás de dinheiro e ainda assim não ter certeza da sua própria sobrevivência, e dos filhos, no passar dos dias. Soco no estômago.
E no meio disso tudo, a perspicácia de Carolina. O olhar que ela tem não somente da favela e favelados (do "quarto de despejo" e dos "despejados"), mas também dos acontecimentos políticos e sociais da época, aponta o quão conectada ela estava com um país e cidade que ignoravam a existência de pessoas como ela. É sempre mais fácil fingir que a fome não existe, que a pobreza não existe, que a favela não existe. A Carolina, com sua escrita, se recusa a desaparecer e ser esquecida.
E houveram várias tentativas, ao longo das décadas, de deixarem a Carolina no esquecimento. Muito se fala sobre a natureza repetitiva do diário, da escrita gramaticalmente incorreta, do foco na contabilidade doméstica. Como se a vida de Carolina e as dificuldades pelas quais ela passou pudessem ser reduzidas a essas "pequenas irritações". É a vida, nas suas dores e valores, pela perspectiva de alguém que a sociedade não via--e, sendo honesta, ainda não vê--como digna de ocupar espaço.
Como prof. de Português, um comentário sobre a linguagem: o que eu mais gostei no livro é a preservação da escrita de Carolina com todos os seus erros. É muito interessante ter contato com um texto reproduzido dessa forma onde esse tipo de escrita, por si só, informa o conteúdo que está sendo abordado e serve como uma outra camada para análise. Eu converso bastante com os meus alunos sobre variedade linguística e que, em certos casos, o que interessa é se fazer entender e não, necessariamente, utilizar a gramática de maneira perfeita. Carolina se faz entender com absoluta clareza aqui: sas lutas, seus sonhos, seu desespero e sua determinação. Uma leitura fantástica.
(Eu noto que li a edicação comemorativa de 60 anos da obra que traz uma nova vida para a mesma.)
É de uma dor ler sobre a rotina dela como mulher na pobreza e miséria da favela que, apesar de ter se passado no final dos anos 50, com certeza ainda demonstra uma realidade dura vivida por muita gente hoje. A luta contra fome é, infelizmente, algo constante e presente. O ato de procurar comida no lixo, de trabalhar como catadora com a finalidade de comprar comida e nem sempre conseguir, a eterna luta atrás de dinheiro e ainda assim não ter certeza da sua própria sobrevivência, e dos filhos, no passar dos dias. Soco no estômago.
E no meio disso tudo, a perspicácia de Carolina. O olhar que ela tem não somente da favela e favelados (do "quarto de despejo" e dos "despejados"), mas também dos acontecimentos políticos e sociais da época, aponta o quão conectada ela estava com um país e cidade que ignoravam a existência de pessoas como ela. É sempre mais fácil fingir que a fome não existe, que a pobreza não existe, que a favela não existe. A Carolina, com sua escrita, se recusa a desaparecer e ser esquecida.
E houveram várias tentativas, ao longo das décadas, de deixarem a Carolina no esquecimento. Muito se fala sobre a natureza repetitiva do diário, da escrita gramaticalmente incorreta, do foco na contabilidade doméstica. Como se a vida de Carolina e as dificuldades pelas quais ela passou pudessem ser reduzidas a essas "pequenas irritações". É a vida, nas suas dores e valores, pela perspectiva de alguém que a sociedade não via--e, sendo honesta, ainda não vê--como digna de ocupar espaço.
Como prof. de Português, um comentário sobre a linguagem: o que eu mais gostei no livro é a preservação da escrita de Carolina com todos os seus erros. É muito interessante ter contato com um texto reproduzido dessa forma onde esse tipo de escrita, por si só, informa o conteúdo que está sendo abordado e serve como uma outra camada para análise. Eu converso bastante com os meus alunos sobre variedade linguística e que, em certos casos, o que interessa é se fazer entender e não, necessariamente, utilizar a gramática de maneira perfeita. Carolina se faz entender com absoluta clareza aqui: sas lutas, seus sonhos, seu desespero e sua determinação. Uma leitura fantástica.
(Eu noto que li a edicação comemorativa de 60 anos da obra que traz uma nova vida para a mesma.)